O Natal é Feliz?
A minha tentativa de uma mensagem de Natal que não seja vazia e repetitiva
As crianças acreditam no Pai Natal.
Alegadamente, existe um velhinho que mora no Pólo Norte e que durante uma noite entrega prendas a todas as crianças do mundo. Excepto, claro, as que tiverem sido mortas durante este ano em qualquer uma das muitas guerras que existem no planeta.
Os mais velhos, as crianças com mais de 18 anos (até aos 80, a maior parte das vezes), continua a acreditar no Pai Natal, mas através do milagre da transubstanciação (ou outro qualquer passe de magia) deixaram de acreditar num velhinho finlandês, para passar a acreditar em outros velhinhos, muitas vezes senis.
Muitas crianças com mais de 18 anos são levadas a acreditar que existem velhinhos já não na Finlândia, mas na América, que também irão trazer presentes grátis para todos. Para muitas destas crianças, estas prendas infelizmente agora já só chegam de 4 em 4 anos. Quando lhes perguntam se se portaram bem, respondem “sim, votei”.
Para outras crianças adultas, o Pai Natal Americano é bastante mais generoso, no entanto. Basta essas crianças adultas terem um pedaço de terra com bons recursos naturais para receberem prendas quase diariamente.
Cada país tem, claro o Pai Natal que merece. Portugal tem ou parece que quer ter um que lhes trará muita felicidade e coisas grátis. Uma figura de Pai, não Natal, mas Marcial. Aliás, O Pai Natal português passou por um processo de recrutamento bastante rígido, em que distribuiu várias doses de prendas a 94,63% dos portugueses. As crianças adoraram e querem agora agradecer ao Pai Natal. As que ainda não morreram de miocardite ou turbo-cancro.
Toda esta felicidade trazida pelos vários Pais Natais às crianças adultas de todo o mundo não é, no entanto, suficiente. E as crianças adultas demonstram essa insatisfação por alturas do Solstício de Inverno, quando os dias se tornam mais pequenos e o frio (no Hemisfério Norte, o único que interessa) se torna mais forte. A depressão vai atacando mais, a vidinha miserável que levaram coloca-lhes um peso na consciência, e por isso criticam o estado actual do mundo, e demonstram a sua esperança num mundo melhor. Um bom ano, que seja pelo menos não tão mau como o que agora acaba.
Comem bacalhau e bolo-rei, bebem copiosamente (mais que nos outros dias) para afastar a tristeza, e sentem-se bem por saberem que o Pai Natal toma conta delas. No dia a seguir os embrulhos rasgados, a ressaca e a conta bancária vazia irão fazer pensar durante uns momentos se valeu a pena. Valeu, e repetirão no próximo ano, porque a esperança é a última coisa a perder.
As crianças sabem que o mundo está mal, mas como crianças que são não sabem o que fazer para o melhorar. Existem crianças adultas que ainda não sabem sequer limpar os seus rabinhos em condições, quanto mais saber o que fazer para melhorar o mundo.
As crianças precisam de acreditar que um Salvador virá. Existem até profecias (alegadamente já concretizadas) de que um Salvador virá. E que melhor do que escrever palavras num livro, para garantir que se virá a concretizar?
Perto do Natal o ciclo da Terra nasce de novo. Os dias começam a ser maiores, e teremos um novo ano, novas colheitas, a possibilidade de novas histórias, de renascer. As crianças recebem prendas e acreditam que elas caem do céu, ou que são entregues por figuras mágicas. Acreditam que um dia por ano, o Bem vence. Por isso compram prendas, enchem a mesa, desejam “Boas Festas” e distribuem abraços.
Amanhã será um novo dia, e podemos voltar a ser os mesquinhos egoístas que sempre fomos, poderemos continuar a ignorar os outros, a pregar a insanidade, e a continuar a ser os FDP do costume, criticando tudo e todos, esperando que o nosso ego prevaleça.
Daqui a um ano voltaremos a ficar surpreendidos que o ano correu mal de novo, o mundo continua a estar cada vez pior, a culpa é do/a Pai Natal que escolhemos, e que afinal não é um Pai Natal verdadeiro. Mas o próximo vai ser.
Mas em Dezembro do próximo ano voltaremos a dizer as mesmas generalidades e platitudes habituais, desejaremos um melhor próximo ano, tudo de bom para ti e para os teus, prometeremos ser melhores, e esperar que o Mundo se conserte a si próprio. Ou que venha o Salvador para o mudar. Nada muda, nada mudará. O ciclo da vida é este, e com a qualidade de Humanidade que temos, não teremos um futuro risonho.
A não ser que venha um Salvador para nos salvar de nós próprios.